segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Entrevista com Seth Suaze.


Aos 32 anos de idade, Seth Suaze é um dos guitarristas que constitui o orgulho e a esperança musical no nosso mosaico cultural. A forma como trata a guitarra acústica, os seus compassos, os seus acordes e a sua voz emprestam-no um perfil diferente do que tem sido trazido por muitos jovens que andam pelos corredores musicais, sobretudo de Maputo. Com uma aprendizagem musical de base religiosa, Seth Suaze vai do gospel ao soul, passando pelo jazz, blues e afro para se situar numa dimensão meramente moçambicana, porque todas as suas criações tem por objectivo último oferecer-nos esta mescla.

Ele já cantou e tocou ao lado de artistas renomados do nosso país, como são os casos de Arão Litsure, Hortêncio Langa, João Cabaço, Stewart, entre outros do estrangeiro. Em entrevista ao nosso Jornal, o jovem artista faz uma viagem pelo mundo dos sons acústicos, fala abertamente do que sente e observa. É ele quem nos diz, quando descreve a situação que actualmente se vive no país
Seth Suaze é um nome que roça o canto de alcunha artística. Será esse o nome de registo civil ou é apenas um cognome?
- O meu nome de registo civil é Filimão Joaquim Suaze. Suaze é o meu apelido e creio que há-de ter havido alguma vaidade por parte do meu avô que deve ter andado por lá. Mas somos de Inharrime, em Inhambane, numa zona chamada Limemene, que é a do rio Limeme, portanto, o apelido original seria Limeme. Sou Machope de Inharrime, mas mais tarde o meu avô emigra e centra-se em Zavala que é onde temos a nossa casa agora. Sob ponto de vista de linhagem, sabemos nós a qual pertencemos.
E Seth é nome de casa, e eu penso que o meu pai se inspirou num nome bíblico, pois há um Seth na Bíblia, por isso não se escreve com E, que vai ao número, mas com H. Então, o que se fez na música foi juntar o meu nome de casa mais o meu apelido e ficou Seth Suaze.
- Quando falamos de Seth Suaze muitas questões nos vêm ao de acima, uma das quais é o facto de muitos o definirem como um músico com influências do Jazz, do Soul, do Blues, mas também com uma base extremamente forte da música moçambicana.
A pergunta é: como Seth Suaze se define musicalmente.
- Esta é uma pergunta muito difícil de responder e penso que qualquer artista teria dificuldades em responder. Nós vamos ao palco e tocamos, as outras pessoas ouvem, ponderam e depois designam. Em outras linhas diria que Seth Suaze é o resultado de muitas situações, uma das quais é a minha igreja que é a Congregacional Unida de Moçambique. Mas também estão Arão Litsure, Hortêncio Langa, Fernando Luís, Majescoral, Stewart Sukuma, entre outros.
Portanto, são as várias experiências que fui tendo até me produzir na pessoa que hoje sou. Quando toco e dizem que a minha música tem raízes moçambicanas é porque grande parte dos ensinamentos e influências vêm dessas fontes. Naturalmente que há artistas de fora que admiro, com maior destaque para George Benson. Se calhar a mescla de música moçambicana, com influências de Jazz, vem do facto de escutar muito a música, e, por instinto natural, não resistir à influências desses estilos.
- Mas, quando e como é que isso começa e quais são as suas raízes?
- Tudo começa em casa, no contexto doméstico. Os meus irmãos mais velhos já tocavam e cantavam na igreja, tenho a sorte e o orgulho de ser de uma família onde foram produzidas muitas canções que se cantam na minha igreja e noutras igrejas, sem que as pessoas soubessem quem são os seus compositores. E eu fiz mais do que fizeram os meus irmãos que foi ter tocar para além da igreja. Mas isso já vem do pastor Arão Litsure, que é da minha igreja, e de quem buscamos o exemplo de que pode se fazer música dentro da igreja, mas também fora. É assim que apareço com os primeiros toques em casa e depois desenvolvidos na igreja.
- Que idade tinha?
- Dez, onze, doze em casa. E depois aos 13/14 anos já tocava na igreja, sozinho ou acompanhando a minha juventude ou mesmo criando alguns grupos ou duetos e trios. Eu cresci no Aeroporto e a minha paróquia era a de Mavalane, e fui praticando o canto e o toque de guitarra assim. Quando começo a tocar fora da igreja conheço o falecido Landocas Ruth. Ele me conhece nas ruas do meu bairro e leva-me para a Organização Continuadores, onde havia um ambiente propício para desenvolver a carreira musical.
Os Mozpipa, os Kapa Dêch, Roberto Isaías, Swit, entre são da “Continuadores” donde também fiz parte. Nós fazíamos parte da banda “Pombas Brancas” criada pelo próprio Landocas. Mais tarde começaram a haver desintegrações de grupos na “Continuadores”, mormente a questão da ocupação. As pessoas começavam a trabalhar e a estudar a níveis que já não lhes permitia ter muita disponibilidade para tocar.
- E que rumo acabou seguindo?
- Da “Continuadores” seguiu-se a fase de afirmação, em que começo a fazer algumas aparições. Participei dos primeiros ensaios da fundação do Majescoral, em 1994, e vim com o grupo até onde pôde. Tive oportunidade de tocar com o pastor Arão Litsure quando voltou do Zimbabwe e quando ia apresentar o concerto “Arão Litsure: dez anos depois”.
Fiz também vários duetos com Hortêncio Langa, Fernando Luís, algumas vezes com João Cabaço e com Stewart Sukuma no “A Quinta no África” no pretenso ano de 2003.
O concerto com Stewart permitiu que fosse conhecido para além da minha igreja. Já tinha um nome enraizado na juventude cristã por causa da correspondência permanente, mas passo a ser mais conhecido pela veia de Stewart nesse concerto, e a tocar com ele. De lá para cá as coisas foram se multiplicando.
- De duetos e trios faz-nos nos vir à memória vários concertos que se realizaram em concursos concertos no nosso país, onde Seth apareceu com o Trio Índico. Este também foi um dos momentos memoráveis na sua afirmação como músico.
- Sim. Foi com o Trio Índico que me afirmei como banda, e isso explica-se pelo facto de que na altura eu tinha mais tempo. Com o Trio Índico chegamos inclusivamente a ganhar alguns prémios. E tudo começa também no contexto religioso porque os outros dois integrantes do Trio Índico (os irmãos Alfa e Falito) são da Igreja do Bom Pastor do Chamanculo, e eu da Igreja Congregacional. Assim, achamos que podíamos juntar nossas experiências e fazer algumas coisas um pouco mais difíceis quer na igreja, quer fora.
Nessa altura eles já orientavam a juventude da igreja deles e eu da minha, para além de que de ambos lados havia uma percepção razoável sobre as tonalidades vocais. Assim nasce o Trio Índico, porque vimos que éramos três e por causa do oceano que nos banha. Participamos e ganhamos o concurso de música francófona no “Franco-Moçambicano”, o que nos valeu uma digressão pela França.
Um ano depois estivemos no concurso regional Cross Roads e ficamos em segundo lugar, o que nos valeu também uma digressão pela Suécia onde participamos num dos festivais de música folclórica e mostramos o nosso potencial na música acústica que foi bastante apreciado.
Com o projecto “Seth Suaze Trio”?
- Sim! Nesse espectáculo ensaiei com os dois moços com que me apresento agora, pois fica sempre a imagem que trago do trio. E no “Seth Suaze Trio” trago o Naldo, que faz coros para Mingas, e Jafeth, um moço que também canta bem. Este é um pressuposto do Trio Índico, se calhar mais evoluído, pois estamos numa fase em que já ouvimos muitas coisas.
Também quando faço esses concertos procuro trazer um segundo momento, no qual saio do acústico para banda e junto pessoas e fazemos coisas diferentes, mas sempre no contexto do mesmo estilo: o afro-jazz.

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