O programa Vivissimo,da Rádio 99fm recebeu o cantor Stewart Sukuma (SS) para um bate- papo em torno do que são os seus projectos e do prémio por si conquistado de canção mais popular do Ngoma Moçambique 2008.
99FM: Parabéns, Stewart, um prémio merecido? Já esperavas?
Stewart Sukuma: Obrigado, e aproveito este início de conversa porque com certeza que não me vais entrevistar, vamos conversar, para dizer que quem sou eu para dizer que mereço o prémio? Não sou eu quem escolhe, e sim o povo, e não existe nada mais satisfatório do que fazer para o povo e ser reconhecido. Sinto-me bastante lisonjeado, feliz, porque o povo reconheceu, e recebeu a mensagem da Felizminha, e devo dizer que a competição do Ngoma tem sempre muitas surpresas e também é preciso respeitar as potencialidades dos outros músicos, neste caso estava a concorrer com a Didácia que é uma intérprete que eu respeito muito, uma jovem da Beira, com uma música muito tocada a nível do país inteiro tanto quanto a Felizminha, agora no momento da verdade, aquele momento mágico em que as pessoas optam por escolher a música com a qual se identificam...
99FM: Stewart, eu tenho aqui um artigo, trecho de uma notícia publicada no jornal Notícias que diz: “...por outro lado fica a dúvida se de facto o prémio de melhor canção teria sido bem entregue é que a musica de Wani nhoxissa de Anita Macuácua pelo ponto de vista de execução rítmica e instrumental para além de outros como o trabalho de estúdio não pode ser comparado ao da música do Stewart Sukuma”. Queres comentar?
SS: Bem é uma situação um bocadinho constrangedora,da minha parte comentar isto porque primeiro, advertir as pessoas que Anita Macuacua é uma cantora excelente, fantástica não a conheço como compositora mas como intérprete é excelente, e segundo, nao conheço a música para fazer uma comparação com Felizminha, o jornalista que escreveu sentiu-se no direito de fazer essa comparação porque conhece as duas músicas em questão, eu queria dizer que nesse aspecto eu sou a pior pessoa para fazer um comentário desses, a única coisa que eu digo é que as pessoas são livres de exprimir a sua opinião.
99FM: Queres comentar sobre algumas outras participações e sobre Anita Macuácua?
SS: Eu acho que é assim: o júri que foi escolhido para fazer essa avaliação, eu não conheço, não sei quem foram nem quais os critérios usados para a escolha das canções e dizer mais uma vez que Anita MacuÁcua é uma cantora excelente, agora quem fez os arrajos da música da Anita era comparativamente melhor, em que aspecto a Felizminha...
99FM: Mas Stewart, tu olhas para os outros músicos que estiveram a participar, olhas para Anita Macuácua, qual é a avaliação?
SS: Eu ai iria falar de categoria, o Ngoma tem várias categorias, melhor voz feminina, melhor voz masculina, melhor canção, revelação, e houve um prémio novo que eu não conhecia, ganho pela Júlia Muwito, o prémio influências, portanto nessas categorias todas, a música Felizminha concorreu para a melhor canção e para a música mais popular, arrecadou o prémio de mais popular e perdeu o prémio para Anita Macuácua, na melhor canção, e eu acho que sou suspeito para falar nesse assunto e defender que a Felizminha era melhor do que a música da Anita Macuácua, primeiro porque seria injusto pelas razões que eu disse antes, não conhecer a canção, agora se o jornalista achou por bem fazer uma análise sobre isso, uma coisa é certa, não há dúvidas de que a Felizminha inserida no disco Nkhuvo, na minha singela opinião, digamos como um crítico da minha própria música está no caminho para aquilo que eu acho que a música moçambicana devia ser, também sou suspeito para dizer isso e não queria de alguma forma soar um bocadinho
a arrogante em relação a isso...
99FM: E se colocássemos o Stewart Sukuma como membro do júri? Estaríamos mal?
SS: Eu dizia Stewart Sukuma ganha (risos), não mais que isso (risos)...é brincadeira...
Eu tenho os meus critérios de avaliação com base naquilo que eu aprendi durante a minha vida de músico, eu experimentei muitas coisas na minha carreira, desde produção de espectáculos, arranjos musicais, produção da própria música, produção executiva, eu digo, não sou um sabichão, mas durante esta caminhada toda, fui aprendendo coisas essenciais que se espelham nas produções que eu faço e se aparece um jornalista a dizer que o Nkuvo, nos últimos cinco anos é um dos melhores discos, eu sinto-me lisonjeado mas chamar a atenção do jornalista... que durante os últimos cinco anos não se fez nada de jeito aqui no país então é do tipo Stewart Sukuma está a competir com Stewart Sukuma. Então, digamos que o panorama musical, artístico-musical não esteve recheado de música de muito boa qualidade, aliás eu estou a falar de música no meu estilo, quero me distanciar, por exemplo, da música pop que criou muito burburinho, muito barulho, e criou um ambiente muito saudável dentro da música pop moçambicana, agora eu faço uma
inclinação, estou com uma música balanceada entre a música para ouvir e para dançar, mas mais para a de ouvir, estou a falar das músicas do meu estilo. A Mingas não lança um disco há muito tempo, o Wazimbo não lança um disco há muito tempo, os Ghorowane, os K10, o Chico António não lançam há muito tempo, então o Nkuvo aparece como um disco sozinho dentro do meu estilo de música, e um disco muito divulgado pelos media.
99FM: Será que vamos ter de dizer que o Stewart Sukuma é o único que está a conseguir viver da música? Como dizias há bocado, a Mingas, o Chico António, os K10, de que já nem se fala, esses que mencionaste, já não se fazem sentir. Então, nesse meio o Stewart Sukuma é quem...
SS: Em termos discográficos, neste ano, sim, mas se calhar é uma fase que todos nos atravessamos, então quero acreditar que a Mingas deve estar a lançar o disco dela muito brevemente, acho que os K10 estão a gravar neste momento, enquanto isso o Nkuvo tem espaço para “reinar”, eu estou numa posição muito favorecida.
99FM: Comenta-se sobre as participações de outros músicos. AchaS que o Nkuvo teve mais sucesso por causa disso?
SS: Eu diria que também, eu acho que ter num CD convidados como Lokua Kanza, Bonga, Roger, Moreira e Gimmy eu acho que faz alguma diferença, mas eu não acho que no seu todo. O Nkuvo, mesmo sem a participação deles seria o Nkuvo porque nós quando tocamos o disco ao vivo as pessoas já têm as músicas encruzadas e nao lhes faz diferenca se naquele momento é o Lokua Kanza a cantar ou se, por exemplo, o Galiza que já fez a parte do Lokua ou se é o Naldo que já fez a parte do Lokua, ou no caso do Roger Moreira, eu acho que essa é a resposta certa de que o povo aceita o disco, nao haja dúvidas de que as pessoas convidadas trouxeram uma mais-valia dentro do Nkuvo, e também frisar que foi dito que a seriedade do disco fez com que convidados desse nivel, com essa estrutura, aceitassem participar no disco porque, atenção, mesmo que eles fossem meus amigos, eles não vinham para o meu disco pelos meus olhos bonitos, se o disco não tivesse esse potencial.
99FM: Stewart, já foste interpelado várias vezes na rua por pessoas que te questionavam sobre o significado da música Felizminha no disco Nkhuvo. Tens algum comentário a fazer?
SS: O Nkuvo é uma história, agora o que pode estar a interrogar as pessoas talvez seja o tipo de arranjo que a gente fez na música, eu acho que ficou um bocadinho diferente do resto do álbum todo, mas isso foi mesmo propositado, para com um tiro matarmos dois coelhos. Então matávamos o coelho da discoteca, e o que as pessoas pudessem ouvir, porque o primeiro arranjo da Felizminha já foi mais acústico, e isso se calhar enquadrar-se-ia no acústico do Nkuvo, e não mais pesado como as pessoas pensam, eu acho que nesse aspecto se as pessoas soubere explicar-se, eu concordo com algumas pessoas que digam, ok a música é um bocadinho pesada em relação às outras, mas no tipo de arranjos que a música levou. Mas em termos de enquadramento, a música historicamente enquadra-se porque a história do Nkuvo é o nascimento de uma criança, e o seu desenvolvimento até o casamento e Felizminha faz parte do pedido de casamento, depois tem a música do lobolo, então a Felizminha enquadra-se perfeitamente na história do Nkuvo.
99FM: Stewart, és daquelas pessoas que aceitam críticas? Fala-nos das tuas qualidades, as boas e as más...
SS: Sim, eu oiço e aproveito sempre o lado bom das críticas. Qualidades, eu gosto de conversar e partilhar, tenho muita paciência para ouvir as pessoas, porque aprendo muito com elas, é uma das melhores coisas que eu tenho, parte má todo o mundo tem, acho que grito muito com as pessoas, acho que isso é feio, quando trabalho com as pessoas eu acho que sou um bocado rude às vezes, eu sou muito exigente e só mais tarde é que as pessoas percebem o porquê, no meu trabalho eu gosto da coisa profissional, perfeita, o que não quer dizer que tenha que ser na perspectiva de outras pessoas mas na minha perspectiva, naquilo que eu desenho para os meus shows, sou muito, muito chato e muitas vezes falto ao respeito as pessoas de alguma forma, nunca é por mal, nem nada pessoal, mas o meu relacionamento no trabalho é muito áspero, sou muito impulsivo, sou capaz de insultar da pior maneira, mas, depois de o trabalho acabar somos amigos de novo, e eu sou uma pessoa de pedir desculpas, tenho também essa qualidade, já pedi descu lpas muitas vezes, já algumas pessoas deixaram de falar comigo por algum tempo mas isso acaba sendo ultrapassado. Eu prefiro trabalhar da seguinte forma: sempre que as pessoas trabalham comigo, advirto-as da forma como eu me comporto em trabalho e se calhar nesse aspecto criar uma plataforma em que as pessoas nao se chateiem comigo.
99FM: Que idade te marcou mais ?
SS: Foi a altura da Independência de Moçambique, em 1975, estava numa idade de mudança devia ter 13 ou 14 anos em que a Independência do povo foi mal compreendida por algumas pessoas e eu sofri um bocadinho isso no aspecto rácico, diziam que mulato não tem bandeira mesmo eu sabendo que não sou mulato, eu sou mais preto que mulato, e orgulho-me disso, as pessoas pelo facto de eu ter o cabelo um pouco mais liso e pelo facto de ter essa mistura, fui alvo desse tipo de provocações e foi uma coisa que levou anos.
99FM: E chegaste a chorar alguma vez por isso?
SS: Não, não me lembro de ter chorado, mas lembro-me de testar a cor da minha pele e eu era miúdo naquela altura, quer dizer ainda muito cru e nao sabia muitas coisas da vida. Este foi um episódio que me ficou marcado e dentro dessa estrutura toda eu lutei sempre para que essa descriminação racial nunca existisse na minha vida em relação a qualquer tipo de raça: brancos, pretos, amarelos, encarnados e cheguei a um ponto em que a única discriminação que existisse fosse a discriminação de classes sociais, entre uma pessoa que não estudou e a outra que estudou mais, e a outra que estudou mais ou menos. Entao é isso, para mim nao existe diferença, quando eu falo com um branco o tratamento é o mesmo.
99FM: Já pensavas em cantar nessa altura?
SS: Já, eu já dançava para um grupo que se chamavam Os Corvos e já queria ser um cantor.
99FM: Então, essa mania de querer cantar já é antiga?
SS: Já é antiga.
99FM: O que é que faria o Stewart Sukuma deitar lágrimas?
SS: Olha já chorei muito quando recebi prémios, quando recebi o meu primeiro prémio do Ngoma, lembro-me de que chorei nessa altura, isto é, das coisas que me lembro mais, e mesmo agora quando recebi o prémio da musica mais popular houve uma lágrima mal parida, uma lágrima que ficou no canto do olho, nao saiu, mas lembro-me desse tipo de emoção, é muito forte para mim. Se eu me lembro bem...é isso, já chorei por amor, já chorei porque me deixaram, foi duro, já me disse uma das minhas namoradas que gostava de outra pessoa...
99FM: Sinceramente, nós estamos sujeitos a isso, a este tipo de situação, e é triste falar de relações. Mas acredito que isso te deve ter dado mais força...
SS: Com certeza, eu normalmente uso esse tipo de afronta como uma forma de me fortalecer, então eu acho que hoje tenho uma outra atitude em relação aos relacionamentos. Nesse momento fiquei quase quatro anos sem ter uma namorada, e hoje isso assusta-me, o facto de eu estar sozinho e precisar de companhia, de uma companheira, então já começo a fazer esforços no sentido de identificar a minha cara metade (risos). É uma confissao em primeira mão (risos), estou a ficar com o coração mole, durante estes últimos qutro anos não me apaixonei.
99FM: Com quantos músicos como o Hortêncio Langa e a Mingas falaste, para que eles se juntem à festa no Havana Bar?
SS: Eu quero mostrar a Moçambique outros talentos que o país tem, como é o caso da Djeny, que foi a melhor voz feminina do Ngoma, então eu acho que faz sentido convidá-la e apresentá-la a um público que não é o dela, é o meu público, e se calhar convidar o público da Djeny, para o meu show. Vou citar o exemplo do Alfa. Quando ele tocou pela primeira vez comigo, as pessoas estavam a perguntar: quem é aquele que cantou Olumwengo contigo? Ele ja tem discos gravados? Então eu quero para que as pessoas conheçam outros artistas que não são muito solicitados, e por acaso o Alfa é um deles. Outro caso é o do Valdemiro José, que não vai poder cantar no meu show no Havana porque tem um show em Quelimane e outro em Mocuba. Ele é um lutador, preocupa-se em agradar o público, quer sempre saber de opiniões acerca disto ou daquilo...
O Caliza, que acho ser uma voz a não perder de vista, e que as pessoas também têm de conhecer, então eu uso o meu espectáculo um bocadinho também para apresentar essas vozes que já são um bocadinho conhecidas, mas não tão conhecidas do meu público, porque às vezes nós somos conhecidos e famosos que achamos que todos têm a obrigação de nos conhecer. Atenção, as pessoas não têm obrigação de nos conhecer.
99FM: Tofo Tofo? Como é que surge esta relação?
SS: Tofo Tofo, a primeira vez que vi um show do Tofo Tofo, foi no dia da vlia de Namaacha, num evento organizado pela 99FM, e despertou-me logo o interesse, porque eu acho que é um grupo que tem uma coisa peculiar, não é um grupo que mexe muito o corp,o o show deles está nas pernas, coisa que não é feita por muita gente. Os que normalmente executam a música moçambicana mexem as ancas, eles não, mexem as pernas.
99FM: Tens estado a aprender algumas coisas?
SS: Com eles? Mas claro, eu acho que há aqui uma grande troca de experiências, de faculdades, no intelecto da dança e da música, então eu dou-lhes o meu espaço em que eles têm a oportunidade de dançar para um público que nao é o deles, mais uma vez, e eu aprendo a dança deles.
99FM: Admiras a Mingas? E o convite, como é que surge?
SS: Admiro a Mingas, e já fiz um convite para a Mingas, não para esta festa, mas para o próximo ano, se não vou gastar os artistas todos. Fiz um convite também para o Wazimbo. As minhas apostas para o ano de 2009 são estes dois artistas, uma colaboração com eles dentro dos meus espectáculos, em que eu quero cantar uma música deles e gostaria que eles cantassem também músicas minhas, vamos marcar as datas dos espectáculos e ver o que a gente faz. Um outro artista que não é moçambicano, com quem vamos ter uma colaboração mais chegada ao longo do ano que vem é o Jeff Maluleque, com o qual eu também me identifico muito. Ele já cá esteve duas vezes. Já conversámos, e é outro dos artistas com o qual pretendo fazer uma digressão pelo país inteiro.
99FM: E o que nos dizes sobre os ensaios?
SS: Falando dos ensaios, eu acho que os resultados que a malta tem dos espectáculos têm como base os ensaios que nós fizemos. Ensaiámos muito no princípio, mas atenção, não são os ensaios que põem uma banda forte, são as constantes actuações. Se perceberes, nóss neste ano não ficámos um mês sem tocar, efetuámos cerca de 25 actuações ao longo do ano inteiro e deu para ter, em média, cerca de dois espectaculos ao vivo por mês.O melhor ensaio é esse, mas também para ensaiar há regras para se conseguir uma boa consistência.
99FM: Quais são essas regras?
SS: A regra é a de manter a música simples, com uma base simples, para dar ênfase ao cantor, porque se há um nome que está à frente, neste caso é o Stewart Sukuma, a banda faz um “backing” faz um suporte, a banda não aparece em primeiro plano, aparece o artista, e a banda a fazer o suporte musical, e neste aspecto é manter uma base de música muito simples que permita que o artista se desenvolva dentro da música e ensaiar as partes mais importantes da música, que são os vínculos, os centros, a dinâmica da música, quando ela sobe e baixa, isso tudo são os segredos para teres um espectáculo com muita dinâmica e animação.
99FM: A banda Nkuvo é constituída por quantos elementos?
SS: A banda Nkuvo tem uma base de 3 elementos principais que são : o Dodó, que ‘e o guitarrista; Nelton Miranda, que é o baixista; e o Stélio que é o baterista. Estes elementos são responsáveis por colaborar comigo nos arranjos da banda e por coordenar todos os ensaios; depois temos uma secção de percurssão constituída pelos Dzinza (Nelson, Nando e Calu Carlos, que são apoiados por Simão, que às vezes toca timbila e djembe ou então o Lindo Cuna, que toca djembe), entao nós funcionamos e, dependendo das actuações, nós vamos chamando as pessoas, há duas vozes fantásticas, que são as da Sezaquiel e da Filó. A Sezaquiel já é uma artista, já é uma cantora e intéprete estabelecida no mercado com disco e tudo. É uma cantora por excelencia, é uma das melhores intérpretes que eu conheci na música popular moçambicana, portanto essa é a constituição do Nkuvo. Ás vezes convidamos um saxofonista, já estivemos a tocar com o Muzila que tem um talento fantástico, tivemos a oportunidade de apresentar o Muzila na gala da 99FM este ano no Centro Cultural Franco-Moçambicano.
99FM: Stewart, o microfone está à tua disposição para as últimas considerações...
SS: Para fechar este papo, desejo a todos um final de ano de 2008 bom, com muito cuidado, e dizer que tenham um 2009 próspero. Gostaria de agradecer a todos aqueles que fizeram com que Felizminha fosse a canção mais popular e também queria sugerir que, se quizerem oferecer uma boa prenda à vossa namorada, ofereçam Felizminha, eu acho que não há melhor.
Fonte: 99fm