MOÇAMBIQUE voltou a brilhar, segunda-feira, nos palcos argelinos, com um exuberante espectáculo notavelmente apresentado pelo agrupamento Eyuphuru, na sua estreia no II Festival Pan-Africano de Cultura, que para a semana termina em Argel.
E à semelhança do que assistimos na semana passada, com os timbileiros de Zavala, o Nyau de Tete e o grupo de Tufo da Mafalala, a banda Eyuphuru apresentou uma extraordinária actuação na qual investiu toda a sua sabedoria, mestria e pujança, para, conforme disse um dos integrantes do grupo, não “queimar” as bem sucedidas prestações até agora conseguidas pelos moçambicanos, nesta mostra cultural, que decorre na capital argelina.
Para além de procurar manter e consolidar a linha de sucessos aberta pelos seus compatriotas no evento, os Eyuphuru subiram ao palco, no Instituto Superior da Música de Argel, também com uma outra missão bem difícil: procurar manter, ou no mínimo, corresponder ao calor sabiamente bem conseguido e interpretado pelos anteriores grupos ao longo da semana passada, durante os espectáculos dos monstros da música africana.
E mais: os Eyuphuru não podiam fazer senão estar ao nível do que os catapultou, tanto é que a diva dos pés descalços e rainha da música africana Cesária Évora, e os outros monstros como Youssou N dour, Mory Kante e Ismael Lo, que por aqui já passaram, mostraram as razões porque ainda levantam plateias.
À partida esta parecia uma missão quase impossível de realizar, mas seguros e confiantes e usando os argumentos de qualidade que lhes caracteriza, eles subiram ao palco e deram um grande espectáculo.
Não defraudaram, antes pelo contrário, levaram ao rubro os “frios” argelinos e os sempre exigentes cidadãos da África Ocidental, que se renderam à fabulosa prestação dos moçambicanos, que agora tem sido objecto de palavras de apreço e de elogios por parte de muitos jornalistas aqui presentes.
“Creio que a actuação do vosso grupo, ultrapassou todas as expectativas. Havia muito receio que os moçambicanos iriam apresentar aqui um espectáculo sem chama nem calor, mas não, eles foram deslumbrantes e ao nível de grupos de outros países que por aqui já passaram”, disse um argelino quando pedido pela nossa Reportagem para tecer comentários em torno da prestação dos Eyuphuru.
“Não sabia que o vosso país também é forte neste tipo de música”, confessou por seu turno, um jornalista da África Ocidental.
Por falar de jornalistas, referir que em razão das suas canções, da sua alegre e sensual dança e dos seus peculiares ritmos coreográficos, o grupo Tufo da Mafalala mereceu uma Menção Honrosa na imprensa argelina, na sequência do espectáculo que quinta-feira última apresentou na região Tizi Ouzou.
Na vertente de cinema, Moçambique estreia sexta-feira com o filme “Hospedes da Noite”, do cineasta Licínio Azevedo.
BATUQUE: UM SÍMBOLO DE ÁFRICA
Maputo, Quarta-Feira, 15 de Julho de 2009:: Notícias Os diversos grupos culturais aqui presentes, desde os da música tradicional, folclórica, do ballet, do jazz, até aos da chamada música ligeira, têm todos eles no tambor o seu principal instrumento de expressão cultural. É um soberbo espectáculo olhar para todos os tambores juntos transformados em batuques.
É ainda um regalo escutar o seu harmonioso, mas diversificado som. Embala o coração de qualquer que esteja presente e a embevecer-se com esse som.
Não é fácil ter-se uma ideia de quantos batuques vieram para a Argélia, trazids dos vários cantos do continente africano, mas não fica longe da verdade dizer que 30 por cento do peso de cada delegação, pode ser atribuído à carga dos batuques. São de diferentes tamanhos e feitios, com os mais diversificados sons. São eles a expressão máxima da cultura africana. São eles os grandes mensageiros do festival de cultura de Argel, pois, qualquer movimento, qualquer ritmo ou gesto, parte e obedece ao som destes batuques. Que espectáculo maravilhoso!
A VIDA DOS ARTISTAS EM ARGEL
APESAR da organização lamentável deste festival, não se pode dizer, porém, que os oito mil artistas presentes no evento vivem em condições adversas. Longe disso. Para acolher o evento, além de disponibilizar dezenas de hotéis, na capital e arredores, as autoridades argelinas construíram em tempo recorde, apenas em nove meses, um monumental complexo residencial, transformado, agora pelos seus habitantes numa verdadeira “aldeia cultural”.
O local, na região planáltica de Zeralda, cerca de 50 quilómetros a Sul de Argel, cobre um espaço considerável de uma vasta área agrícola, preenchida por videiras e macieiras, entre outras fruteiras.
Fonte da organização disse ao “Noticias”, que nesta aldeia estão alojados 2500 artistas, representando os 50 países participantes no festival. Garantiu que apesar da presença de tanta gente no local, não se vislumbra nenhum perigo iminente, quer em termos de saúde, quer em termos da segurança, uma vez que o complexo possui todas as condições habitacionais, infra-estruturais e de segurança para uma vida tranquila e sossegada dos seus moradores.
De facto, são irrepreensíveis as condições de segurança, higiene e salubridade que o “Noticias” constatou no local, que igualmente acolhe parte dos responsáveis e artistas moçambicanos, incluindo os membros do Eyuphuru e do grupo de Tufo. Para além das impecáveis instalações sanitárias, de lavandaria, piscinas, cozinha e refeitórios, salas de música, dança e teatro (que servem também para os ensaios dos artistas), o local é também adoptado por uma vasta área de jardinagem, um espaçoso salão de Internet Café, com centenas de computadores, e dormitórios climatizados.
PERFEITO SISTEMA DE SEGURANÇA PARA PROTEGER OITO MIL ARTISTAS
Notícias As medidas de segurança são simplesmente extremas. Para além da presença massiva da polícia fortemente armada dentro das instalações, a área é também vigiada por unidades motorizadas e de infantaria do exército argelino, incluindo forças que usam helicópteros que permanentemente sobrevoam a área.
Os jornalistas, incluindo os dos países ali representados, para terem acesso ao local, apenas são permitidos através de visitas programadas pelos organizadores do grande show de cultura.
“Isto aqui até parece a nossa “BO”, desabafou o baterista dos Eyuphuru, Jorge Cossa, em declarações ao “Noticias”, criticando, por outro lado, e em termos severos as rigorosas regras da “lei seca” adoptadas pela direcção do recinto. “Aqui só se bebe sumo, refresco e água”, lamentou.
Tratando-se de um sítio completamente isolado de outras áreas residenciais (a comunidade mais próxima situa-se a cerca de cinco quilómetros do local), os moradores da aldeia, que são na verdade a nata cultural de África (entre artesãos, músicos, dançarinos, escultores, xilografistas e gente das artes plásticas, entre outros), estão de facto impossibilitados de qualquer contacto com o mundo exterior, senão apenas através da Internet, ou quando se deslocam para os recintos de espectáculos.
Essas saídas são também feitas em grupos, através da luxuosa frota de autocarros pertencentes ao primeiro-ministro argelino, que ganhou o concurso então lançado para a prestação destes serviços.
Dados disponibilizados pela organização referem que para este festival vieram para Argel, 50 países de África, integrando um total de oito mil artistas, dos quais 2860 dançarinos da música folclórica, tradicional e ligeira, 600 artesãos, 232 agentes do cinema e 160 escritores, editores, poetas e conferencistas. Estão previstos, ao longo do evento 500 espectáculos musicais, a edição e reedição de 250 títulos, a apresentação de 41 peças teatrais e a abertura de nove exposições de artes plásticas.
Para a actuação de todos os artistas aqui presentes e exibição de todo este manancial cultural, as autoridades argelinas dispõem de 25 espaços públicos, preparados especificamente para o efeito.
FESTIVAL FRANCO-ÁRABE(?) E OS TRANSTORNOS À VOLTA
O árabe e o francês são, por esta ordem, as duas línguas que dominam o II Festival Pan-Africano de Cultura que decorre em Argel. Um domínio que não deixa espaço para os outros idiomas.
Todas as comunicações e diálogos, oficiais ou informais, são feitas nestas línguas. Só para ter uma ideia do domínio que o árabe exerce sobre as outras línguas, um pequeno exemplo; o discurso oficial da abertura do evento, apresentado por um proeminente membro do governo argelino em representação do presidente Abdelaziz Bouteflika, que não veio à cerimónia por ter perdido a mãe horas antes, foi lido em árabe e sem tradução.
Como se pode depreender, não são poucos os transtornos e a confusão que a situação cria, sobretudo entre os jornalistas anglófonos, lusófonos e os próprios francófonos que cobrem o evento.
Num evento desta magnitude temos visto que a língua inglesa é pura e simplesmente subalternizada. Reduzida a nada e com os seus utentes a sentirem-se humilhados e envergonhados para usá-la.
Estão presentes neste festival, por sinal de Cultura (onde a língua é um importante acervo no património cultural de um povo), todos os povos africanos. Anglófonos, francófonos, lusófonos, árabes, grupos tribais e étnicos. Vieram todos os africanos. Porém, os argelinos, propositadamente ou não, quiseram simplesmente exercer um domínio de uma cultura sobre as outras. Muitos dos participantes ao evento têm comentado que, pela forma como as coisas estão a decorrer, parece-nos que estamos perante um fenómeno de desprezo pelas culturas dos outros num festival continental de cultura.
Questiona-se também o facto de não existirem documentos oficiais do festival em português ou inglês.
A título de exemplo, a África do Sul contribuiu com quase 10 milhões, dos 60 milhões de dólares investidos no evento. Mas, não se encontra razão para não terem sido contratados tradutores em número suficiente para se ocuparem da documentação.
“Não estamos contra a arabização do festival nem a sua franconização. Longe disso. Defendemos apenas, isso sim, que se tratando de um festival cultural deveria ter havido o cuidado de se respeitar ao máximo, as culturas de outros povos. Era o mínimo que se podia fazer”, desabafou um jornalista anglófono ouvido pela nossa Reportagem.
Em virtude desta situação, várias vezes temos vistos jornalistas não falantes do árabe, a recorrerem apenas à mímica para obterem informações.
Estas situacao eh alias, o pão de cada dia no El Aurassi, o hotel que alberga os cerca de 250 jornalistas presentes neste evento, principalmente com os empregados do restaurante e dos quartos.
Reparem que para minimizar os inconvenientes e dificuldades de língua, o nosso grande comunicador, Gabriel Júnior, sim, o produtor e apresentador do programa televisivo, Moçambique em Concerto, na TVM, teve de inventar com a imprevisibilidade que lhe eh peculiar, uma nova “língua”. Uma mistura de português, árabe, francês, inglês e linguas africanas. Trata-se de um idioma inexistente, todavia, agradável e cómica de se ouvir. Eh por todos compreendida, mas ao mesmo tempo, não entendida por ninguém. So permite ao autor desenrascar-se em todas as situacoes. E vai conseguindo. Mas apesar disso, o nosso “show man”, assim como tantos outros jornalistas aqui presentes, já fez um juramento: de regresso, logo que chegar a Maputo, a primeira coisa que vai fazer, mesmo antes de se apresentar na sua redacção, eh matricular-se numa escola árabe e de francês, tudo em defesa da nossa cultura.
DAVID FILIPE, em Argel
E à semelhança do que assistimos na semana passada, com os timbileiros de Zavala, o Nyau de Tete e o grupo de Tufo da Mafalala, a banda Eyuphuru apresentou uma extraordinária actuação na qual investiu toda a sua sabedoria, mestria e pujança, para, conforme disse um dos integrantes do grupo, não “queimar” as bem sucedidas prestações até agora conseguidas pelos moçambicanos, nesta mostra cultural, que decorre na capital argelina.
Para além de procurar manter e consolidar a linha de sucessos aberta pelos seus compatriotas no evento, os Eyuphuru subiram ao palco, no Instituto Superior da Música de Argel, também com uma outra missão bem difícil: procurar manter, ou no mínimo, corresponder ao calor sabiamente bem conseguido e interpretado pelos anteriores grupos ao longo da semana passada, durante os espectáculos dos monstros da música africana.
E mais: os Eyuphuru não podiam fazer senão estar ao nível do que os catapultou, tanto é que a diva dos pés descalços e rainha da música africana Cesária Évora, e os outros monstros como Youssou N dour, Mory Kante e Ismael Lo, que por aqui já passaram, mostraram as razões porque ainda levantam plateias.
À partida esta parecia uma missão quase impossível de realizar, mas seguros e confiantes e usando os argumentos de qualidade que lhes caracteriza, eles subiram ao palco e deram um grande espectáculo.
Não defraudaram, antes pelo contrário, levaram ao rubro os “frios” argelinos e os sempre exigentes cidadãos da África Ocidental, que se renderam à fabulosa prestação dos moçambicanos, que agora tem sido objecto de palavras de apreço e de elogios por parte de muitos jornalistas aqui presentes.
“Creio que a actuação do vosso grupo, ultrapassou todas as expectativas. Havia muito receio que os moçambicanos iriam apresentar aqui um espectáculo sem chama nem calor, mas não, eles foram deslumbrantes e ao nível de grupos de outros países que por aqui já passaram”, disse um argelino quando pedido pela nossa Reportagem para tecer comentários em torno da prestação dos Eyuphuru.
“Não sabia que o vosso país também é forte neste tipo de música”, confessou por seu turno, um jornalista da África Ocidental.
Por falar de jornalistas, referir que em razão das suas canções, da sua alegre e sensual dança e dos seus peculiares ritmos coreográficos, o grupo Tufo da Mafalala mereceu uma Menção Honrosa na imprensa argelina, na sequência do espectáculo que quinta-feira última apresentou na região Tizi Ouzou.
Na vertente de cinema, Moçambique estreia sexta-feira com o filme “Hospedes da Noite”, do cineasta Licínio Azevedo.
BATUQUE: UM SÍMBOLO DE ÁFRICA
Maputo, Quarta-Feira, 15 de Julho de 2009:: Notícias Os diversos grupos culturais aqui presentes, desde os da música tradicional, folclórica, do ballet, do jazz, até aos da chamada música ligeira, têm todos eles no tambor o seu principal instrumento de expressão cultural. É um soberbo espectáculo olhar para todos os tambores juntos transformados em batuques.
É ainda um regalo escutar o seu harmonioso, mas diversificado som. Embala o coração de qualquer que esteja presente e a embevecer-se com esse som.
Não é fácil ter-se uma ideia de quantos batuques vieram para a Argélia, trazids dos vários cantos do continente africano, mas não fica longe da verdade dizer que 30 por cento do peso de cada delegação, pode ser atribuído à carga dos batuques. São de diferentes tamanhos e feitios, com os mais diversificados sons. São eles a expressão máxima da cultura africana. São eles os grandes mensageiros do festival de cultura de Argel, pois, qualquer movimento, qualquer ritmo ou gesto, parte e obedece ao som destes batuques. Que espectáculo maravilhoso!
A VIDA DOS ARTISTAS EM ARGEL
APESAR da organização lamentável deste festival, não se pode dizer, porém, que os oito mil artistas presentes no evento vivem em condições adversas. Longe disso. Para acolher o evento, além de disponibilizar dezenas de hotéis, na capital e arredores, as autoridades argelinas construíram em tempo recorde, apenas em nove meses, um monumental complexo residencial, transformado, agora pelos seus habitantes numa verdadeira “aldeia cultural”.
O local, na região planáltica de Zeralda, cerca de 50 quilómetros a Sul de Argel, cobre um espaço considerável de uma vasta área agrícola, preenchida por videiras e macieiras, entre outras fruteiras.
Fonte da organização disse ao “Noticias”, que nesta aldeia estão alojados 2500 artistas, representando os 50 países participantes no festival. Garantiu que apesar da presença de tanta gente no local, não se vislumbra nenhum perigo iminente, quer em termos de saúde, quer em termos da segurança, uma vez que o complexo possui todas as condições habitacionais, infra-estruturais e de segurança para uma vida tranquila e sossegada dos seus moradores.
De facto, são irrepreensíveis as condições de segurança, higiene e salubridade que o “Noticias” constatou no local, que igualmente acolhe parte dos responsáveis e artistas moçambicanos, incluindo os membros do Eyuphuru e do grupo de Tufo. Para além das impecáveis instalações sanitárias, de lavandaria, piscinas, cozinha e refeitórios, salas de música, dança e teatro (que servem também para os ensaios dos artistas), o local é também adoptado por uma vasta área de jardinagem, um espaçoso salão de Internet Café, com centenas de computadores, e dormitórios climatizados.
PERFEITO SISTEMA DE SEGURANÇA PARA PROTEGER OITO MIL ARTISTAS
Notícias As medidas de segurança são simplesmente extremas. Para além da presença massiva da polícia fortemente armada dentro das instalações, a área é também vigiada por unidades motorizadas e de infantaria do exército argelino, incluindo forças que usam helicópteros que permanentemente sobrevoam a área.
Os jornalistas, incluindo os dos países ali representados, para terem acesso ao local, apenas são permitidos através de visitas programadas pelos organizadores do grande show de cultura.
“Isto aqui até parece a nossa “BO”, desabafou o baterista dos Eyuphuru, Jorge Cossa, em declarações ao “Noticias”, criticando, por outro lado, e em termos severos as rigorosas regras da “lei seca” adoptadas pela direcção do recinto. “Aqui só se bebe sumo, refresco e água”, lamentou.
Tratando-se de um sítio completamente isolado de outras áreas residenciais (a comunidade mais próxima situa-se a cerca de cinco quilómetros do local), os moradores da aldeia, que são na verdade a nata cultural de África (entre artesãos, músicos, dançarinos, escultores, xilografistas e gente das artes plásticas, entre outros), estão de facto impossibilitados de qualquer contacto com o mundo exterior, senão apenas através da Internet, ou quando se deslocam para os recintos de espectáculos.
Essas saídas são também feitas em grupos, através da luxuosa frota de autocarros pertencentes ao primeiro-ministro argelino, que ganhou o concurso então lançado para a prestação destes serviços.
Dados disponibilizados pela organização referem que para este festival vieram para Argel, 50 países de África, integrando um total de oito mil artistas, dos quais 2860 dançarinos da música folclórica, tradicional e ligeira, 600 artesãos, 232 agentes do cinema e 160 escritores, editores, poetas e conferencistas. Estão previstos, ao longo do evento 500 espectáculos musicais, a edição e reedição de 250 títulos, a apresentação de 41 peças teatrais e a abertura de nove exposições de artes plásticas.
Para a actuação de todos os artistas aqui presentes e exibição de todo este manancial cultural, as autoridades argelinas dispõem de 25 espaços públicos, preparados especificamente para o efeito.
FESTIVAL FRANCO-ÁRABE(?) E OS TRANSTORNOS À VOLTA
O árabe e o francês são, por esta ordem, as duas línguas que dominam o II Festival Pan-Africano de Cultura que decorre em Argel. Um domínio que não deixa espaço para os outros idiomas.
Todas as comunicações e diálogos, oficiais ou informais, são feitas nestas línguas. Só para ter uma ideia do domínio que o árabe exerce sobre as outras línguas, um pequeno exemplo; o discurso oficial da abertura do evento, apresentado por um proeminente membro do governo argelino em representação do presidente Abdelaziz Bouteflika, que não veio à cerimónia por ter perdido a mãe horas antes, foi lido em árabe e sem tradução.
Como se pode depreender, não são poucos os transtornos e a confusão que a situação cria, sobretudo entre os jornalistas anglófonos, lusófonos e os próprios francófonos que cobrem o evento.
Num evento desta magnitude temos visto que a língua inglesa é pura e simplesmente subalternizada. Reduzida a nada e com os seus utentes a sentirem-se humilhados e envergonhados para usá-la.
Estão presentes neste festival, por sinal de Cultura (onde a língua é um importante acervo no património cultural de um povo), todos os povos africanos. Anglófonos, francófonos, lusófonos, árabes, grupos tribais e étnicos. Vieram todos os africanos. Porém, os argelinos, propositadamente ou não, quiseram simplesmente exercer um domínio de uma cultura sobre as outras. Muitos dos participantes ao evento têm comentado que, pela forma como as coisas estão a decorrer, parece-nos que estamos perante um fenómeno de desprezo pelas culturas dos outros num festival continental de cultura.
Questiona-se também o facto de não existirem documentos oficiais do festival em português ou inglês.
A título de exemplo, a África do Sul contribuiu com quase 10 milhões, dos 60 milhões de dólares investidos no evento. Mas, não se encontra razão para não terem sido contratados tradutores em número suficiente para se ocuparem da documentação.
“Não estamos contra a arabização do festival nem a sua franconização. Longe disso. Defendemos apenas, isso sim, que se tratando de um festival cultural deveria ter havido o cuidado de se respeitar ao máximo, as culturas de outros povos. Era o mínimo que se podia fazer”, desabafou um jornalista anglófono ouvido pela nossa Reportagem.
Em virtude desta situação, várias vezes temos vistos jornalistas não falantes do árabe, a recorrerem apenas à mímica para obterem informações.
Estas situacao eh alias, o pão de cada dia no El Aurassi, o hotel que alberga os cerca de 250 jornalistas presentes neste evento, principalmente com os empregados do restaurante e dos quartos.
Reparem que para minimizar os inconvenientes e dificuldades de língua, o nosso grande comunicador, Gabriel Júnior, sim, o produtor e apresentador do programa televisivo, Moçambique em Concerto, na TVM, teve de inventar com a imprevisibilidade que lhe eh peculiar, uma nova “língua”. Uma mistura de português, árabe, francês, inglês e linguas africanas. Trata-se de um idioma inexistente, todavia, agradável e cómica de se ouvir. Eh por todos compreendida, mas ao mesmo tempo, não entendida por ninguém. So permite ao autor desenrascar-se em todas as situacoes. E vai conseguindo. Mas apesar disso, o nosso “show man”, assim como tantos outros jornalistas aqui presentes, já fez um juramento: de regresso, logo que chegar a Maputo, a primeira coisa que vai fazer, mesmo antes de se apresentar na sua redacção, eh matricular-se numa escola árabe e de francês, tudo em defesa da nossa cultura.
DAVID FILIPE, em Argel
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